Em entrevista coletiva em Washington, o economista-chefe do Banco Mundial para a América Latina, Augusto de la Torre, disse que o país precisa “racionalizar” seus gastos e receitas para não gerar inflação por um lado, e ser obrigado a combater a alta dos preços com aumentos de juros, por outro.
“As perspectivas de longo prazo (para o Brasil) são muito favoráveis. O desafio do Brasil é o curto prazo: a combinação difícil de resolver as pressões inflacionárias acompanhadas de desaceleração econômica”, disse De la Torre.
O economista notou que esta é uma situação “inusitada”, pois normalmente a desaceleração econômica vem acompanhada de redução na inflação.
No Brasil, entretanto, apesar das baixas taxas de crescimento, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) registrou em março a maior taxa em 11 anos: 0,92%, segundo o IBGE.
Mesmo depois de sucessivos aumentos de juros, a inflação em 12 meses chegou a 6,15% – perto do teto da banda inflacionária, que é de 6,5%.
Em Nova York, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, minimizou o problema, dizendo que a alta é passageira e a meta de superávit primário neste ano será cumprida.
“O governo sempre se preocupa com inflação… O que estamos tendo agora é por causa da seca”, disse o ministro, após participar de um almoço com investidores.
‘Disciplina fiscal’
Em seus relatórios e em declarações de técnicos, o Fundo tem dito que considera “apropriada” a política do Banco Central brasileiro de elevar as taxas de juros para combater a inflação.
Entretanto, as sucessivas altas também pesam na atividade econômica – dificultando empréstimos por parte de empresas e pessoas e diminuindo, assim, o dinheiro movimentando a economia – e explicam a magra projeção de crescimento de 1,8% para o país neste ano.
Para o FMI e o Banco Mundial, o país precisa reforçar o controle à inflação não apenas através dos juros, mas também com um controle de gastos – apesar das pressões do ano eleitoral, em que governos costumam abrir os cofres.
Especificamente, o FMI questionou as “atividades quase-fiscais” do Brasil, uma referência, no caso brasileiro, aos empréstimos do Tesouro aos bancos públicos, como o BNDES.
Ainda nesta quarta-feira, o chefe de divisão do Departamento de Assuntos Fiscais do FMI, Julio Escolano, disse que o país deve manter a “disciplina fiscal” em 2014 e considerar elevar, em 2015 e no médio prazo, a economia que faz para pagar suas dívidas, o chamado superávit primário.
“No momento, o governo está expressando intenções de disciplina fiscal em 2014. Achamos que isso é importante e que é apropriado fazê-lo neste ano”, disse Escolano.
“A partir de 2015 e no médio prazo, o Brasil precisa estabelecer uma meta mais ambiciosa, voltando ao superávit primário que tinha antes, de 3%”.
“Outros desafios específicos a serem enfrentados são a disciplina dos governos regionais (estados e municípios), que tem sido um fator importante de pressão sobre as finanças públicas; conter os empréstimos da União aos bancos públicos, o que é uma importante pressão no Orçamento; e não contar com itens excepcionais (que ajudam no financiamento das contas públicas).”
Desafogar a política monetária
Para De la Torre, se cuidar do seu desempenho fiscal, o governo brasileiro pode dar “mais espaço” e “flexibilidade” para executar uma política monetária que não descuide da inflação e ao mesmo tempo permita maior crescimento econômico.
“É preciso ter políticas fiscais mais ajustadas para abrir espaço e dar maior flexibilidade à política monetária, para que o Banco Central possa reduzir as taxas de juros sem repercussões inflacionárias”, disse o economista do Banco Mundial.
Isso implicaria “uma visita cuidadosa a todo o processo de finanças públicas, dos gastos e receitas”, disse De la Torre.
“Mudar a mescla de políticas fiscal e monetária é um processo político difícil, mas do ponto de vista puramente técnico seria conveniente ao Brasil rebalancear as políticas, na direção de uma política fiscal mais ajustada que permita uma política monetária mais frouxa.”